EDITORIAL – Não leve sua ‘esportiva’ tão à sério
Motos esportivas foram feitas e projetadas para uma pilotagem radical. São motocicletas de alto desempenho feitas para andar em alto giro, ou seja: correr! É difícil segurar a vontade de acelerar e de testar limites. Mas isso tem sido levado à sério demais.
Em 2015 cerca de 11 motociclistas morreram e outros tantos saíram seriamente machucados e até mutilados nas estradas do Ceará pilotando motos esportivas. Muitos atribuem à moto esportiva a culpa pelos acidentes. Outros condenam a postura dos pilotos. Muitos a falta de treinamento. Porém esta não é a regra dos sinistros. Outros pilotos experientes, que disputam track days em autódromos também se acidentaram ou morreram.
Um acidente de moto seguido de morte não é resultado de uma única causa, mas de várias que se somam. Três fatores devem ser levados em conta: O piloto, a máquina e o sistema viário. Basta que dois destes se cruzem para que um acidente ocorra.
Não há no Brasil estatísticas confiáveis a respeito das causas de acidentes com motociclistas, daí cada um dá a sua versão e no final acaba ficando a de que moto esportiva mata mais que custom e big trail. É aqui que começa outra discussão tipo coxinhas x petralhas, a qual não leva a lugar nenhum além do hospital, cemitérios ou a perda de amizades.
Um fator tem me chamado a atenção e há anos vários especialistas em segurança e jornalistas especializados vêm alertando. São os Guard-Rails. Eles são equipamentos de segurança colocados nas vias com o objetivo de evitar que um veículo descontrolado passe para a pista contrária ou deixe que o veículo venha a cair em precipícios ou bater em paredes de pedra. Os guard-rails já salvaram a vida de muitos motoristas de carros, caminhões e ônibus, mas quando se trata de motocicletas ele é uma ferramenta que provoca mortes e mutilações.
A forma como são colocados nas vias é o grande problema. Eles são montados com meia cobertura onde a parte de cima possui uma placa que absorve o choque e deforma-se retendo em grande parte o impacto do veículo. Porém é a parte debaixo que ficam aberta que mata motociclistas. No Brasil eles não são completos e isso faz com que os acidentes com moto e guard-rails sempre terminem mal. Essa parte inferior, se coberta, ajudaria a reter boa parte do impacto do motociclista. No acidente de carro,ônibus ou caminhão o motorista está dentro do veículo e é só o veículo que se choca com a parede de metal a maioria se salva ilesa. No caso da moto há uma divisão. Moto para um lado e motociclista para outro. É aqui o problema. O motociclista irá se chocar com as estacas que sustentam o guard-rail e dependendo do impacto podem resultar fraturas graves, mutilações e até a morte.
O nosso sistema viário já ajudou a matar muita gente. Mas a imprudência e a busca de uma adrenalina mortal fazem os pilotos irem além dos limites e, isso, não é apenas privilégio de esportivas. Ultrapassagens mal planejadas, falta de treinamento, pilotos sem CNH, motos sem manutenção, pneus desgastados, motociclistas bêbados e excesso de confiança, estão, também, ajudando a matar. Para o motociclista Joaquim Veras “velocidade mata e as batalhas urbanas contribuem para acidentes principalmente com motociclistas inexperientes, excesso de confiança e falta da busca de informação sobre a moto e pilotagem segura.” Afirma Veras.
Sempre que perdemos um amigo motociclista a dor é imensa. A família perde um ente querido e na maioria das vezes o principal provedor. Filhos ficam órfãos.
Já andei em esportivas e gostei da adrenalina de acelerar. Já fiz a loucura de andar por centenas de quilômetros na casa dos 180 km/h a 200 km/h em uma viagem. Ao chegar em casa quando fiz as contas da gostosa imprudência, decidi que queria correr menos risco, pois tinha a certeza que não controlaria a vontade de elevar o giro outra vez. Assim, coloquei a minha 1250 para vender. Baixei a cilindrada para 650 e pequei uma big-trail. Além de entender que eu piloto não conseguiria me segurara e que a moto me puxava para isso e que estradas não são lugar para correr decidi que queria passar ainda mais tempo com a minha família e meus amigos. Não estou falando para você desistir da sua esportiva. Minha decisão não é espelho e nem receita fechada. Se você conseguir controlar seu punho continue divertindo-se com ela.
É importante sempre que a tentação de acelerar mais forte bater no punho que você pense em tudo que deixará para trás caso algo dê errado. O filósofo Sêneca dizia que “é mais importante viver bem do que viver muito”, mas ele não quis dizer com isso que, necessariamente, você precise se matar tentando abusar dos limites. Exatamente por isso não leve a sua ‘esportiva’ tão à sério.