O Vendedor e o tirador de pedido
A melhor venda é sempre aquela na qual o cliente entra com um problema e compra uma solução e não um preço.”
(*) Luís Sucupira
Há quem diga que a profissão mais antiga do mundo é a prostituição. Tentando colocar uma luz na máxima briga de quem veio primeiro o ovo ou a galinha, puxei mais um pouco pra trás e cheguei à conclusão que a profissão de vendedor é a mais antiga. Ora, se foi a prostituição imagine que a primeira pessoa que realizou a oferta, na realidade, era um vendedor. Ela descobrira que seu corpo era um produto e, se, trocado por dinheiro lhe renderia um bom lucro.
Para que haja uma venda é necessário que exista de um lado o vendedor e do outro um comprador. Alguém com algo a oferecer e outro com algo a comprar. Partido dessa premissa e retornando aos primórdios da humanidade, podemos perceber que o homem já gostava de comercializar suas coisas através da troca. Isso também era uma venda. Mercadores trocavam ferramentas por comida, comida por escravos e por ai vai.
Essa característica da personalidade humana trouxe à luz um personagem e uma profissão que é a base de toda a cadeira comercial: o vendedor. Com ele veio também o tirador de pedido, o qual também podemos chamar de o genérico do vendedor, ou um vendedor que não deixa a sua marca e nem estilo.
A profissão de vendedor é ainda a única que não depende de faculdade e nem de formação, mas de vocação. É a mais democrática das profissões e exige apenas talento não importando classe social, cor, sexo ou grau de parentesco. É ainda a única que permite que uma pessoa comece do nada, até mesmo sem capital e se transforme em pouco tempo em um rico empresário ou um rico vendedor.
Mas, nas lojas, existem dois personagens que se confrontam permanentemente: o vendedor x o tirador de pedido. O tirador de pedido é aquele que reclama de tudo. Reclama da comissão, do café, dos produtos, da promoção, da publicidade. Bota a culpa em qualquer coisa. Culpa o tempo e o feriado que passou e os que ainda virão. Culpa a economia, o camelô, o prefeito, o governador… Até o Lula leva a culpa para que ele possa desculpar-se (ou seja, tirar a própria culpa) na justificativa de não vender. No fim do mês reclama do salário e xinga a comissão que considera baixa. Por fim, está sempre mudando de loja ou mesmo passando uma chuva.
Já o vendedor age diferente. Busca aprender sobre o produto, faz a sua meta de venda para formar o salário etc. Geralmente não reclama, e se reclama, é sempre por conta da falta de um produto que ele sabe que vende bem e gira rápido.
Duas situações refletem muito bem a diferença entre os dois.
Certa vez pude observar os dois em ação quando fui buscar um produto em promoção. Estava pesquisando um mouse. Ainda não havia definido qual a cor, a marca ou o tipo. Na entrada da loja vi um desses panfletos promocionais contendo uma lista de produtos.
Um rapaz veio me atender e eu perguntei:
– Bom dia, o mouse da promoção, por favor.
– Bom dia. É este aqui senhor. Respondeu ele.
Olhei, depois peguei o produto. Dei uma pausa e já estava pra sair quando ele me disse:
– Olha… tem um mais barato….
Achei que ele estava com medo de que eu não levasse o mouse da promoção e prontamente me ofereceu uma opção mais barata, sem sequer saber se preço seria a base da minha decisão de compra.
– Ok… mas estou olhando… Respondi.
– Se precisar de algo estou por aqui.
Disse isso e afastou-se indo atender a outro cliente. De longe fiquei analisando o vendedor e percebi que ele usava a mesma estratégia de venda. O cliente perguntava sobre um produto e ele indicava o mais barato sem nem saber se era preço que o cliente queria. Depois apresentar o preço e fechar a venda ele entrega um pedidinho num papel com seu nome e levava o cliente ao caixa. Logo percebi que aquele era um autêntico tirador de pedido. Pedido tirado, próximo cliente. Não importava se o valor da venda: ela tinha que ser rápida, barata e ele precisava preencher o nome no papel. Feito isso ele passava a buscar outra venda, ou melhor, tirar outro pedido.
Enquanto observava o tirador de pedido um outro vendedor chegou e se apresentou. Eu ainda estava com o mouse barato na mão.
– Bom dia, senhor. Este mouse é o mais barato que nós temos, mas me deixe lhe mostrar uma novidade. O senhor conhece o mouse ótico e sem fio?
– Não… conhecia o ótico, mas sem fio… ainda não. Respondi com ar de interesse.
– Senhor, o mouse sem fio elimina o desagradável problema de acúmulo de fios e lhe dá mais liberdade e melhor mobilidade. É bem mais confortável e não exige manutenção pois, não tem bolinha. Também não trava por conta da sujeira.
-Quanto custa? Perguntei curioso.
– O senhor usa notebook?. Respondeu ele com outra pergunta.
– sim…
– Ele é ótimo, pois nada mais chato que aquele mouse de mesa, né? Me lembrou ele.
Antes de me passar o preço, ele teve o cuidado de informar as condições de pagamento.Foi tão direto que eu deixei o mouse baratinho e me convenci que ele estava certo. O melhor pra mim era aquele mesmo: o ótico sem fio.
Para alguns ele me vendeu o mais caro. Pra mim ele vendeu o que eu precisava.
Ai está a diferença. Um queria tirar logo o pedido, o outro, não. O segundo já sabia que a venda estava feita. Ou seria o da promoção ou o mais barato, assim apresentou-me a novidade e através de perguntas diretas percebeu que era o que precisava. Me orientou. Mesmo que não viesse a comprar, pelo menos eu estaria sabendo que aquele produto existia. Ou seja: ele me mostrou uma solução e me vendeu um recurso, não um preço. Outra: vendedor bom acaba incorporando a marca da empresa ao seu nome. Tipo assim: José da venda s/a.
Isso me fez lembrar de uma estória que falava de dois vendedores de sapatos que foram visitar uma cidade. A cidade tinha uma característica peculiar: todas as pessoas usavam sandálias. No relatório do primeiro vendedor, que nada vendeu, ele dizia: – “Não vale a pena tentar vender sapatos aqui. Todo mundo usa sandálias”. O segundo que vendeu alguns pares escreveu: – “Excelente oportunidade para vender sapatos. Aqui todo mundo só usa sandálias e por isso existem muitas queixas de dores nos pés, joanetes, calos etc. Vendi alguns, mas vou voltar novamente para vender mais.”
Sempre nos treinamentos que dou a vendedores tento decorar alguns rostos. No ano seguinte, quando volto, busco relembrá-los e pergunto quem já havia participado de um treinamento comigo. A grande maioria é de novatos pois, o turn over é alto. Facilmente percebo os vendedores e aqueles que no ano passado estavam apenas passando uma chuva.
Ai fica a dica: venda o recurso, pois a melhor venda é sempre aquela na qual o cliente entra com um problema e compra uma solução e não um preço.
Luís Sucupira é consultor, publicitário e jornalista.