Twitter: "Quando o torcedor tomou conta do profissional…"
Há pouco tempo abordei aqui o fato de uma professora de ensino fundamental, de 28 anos, ter sido demitida após um vídeo em que ela aparece dançando sensualmente ao lado de um grupo de pagode, em Salvador, cair na internet. As imagens foram registradas, em meados de junho de 2009, por várias pessoas que estavam na plateia de uma casa noturna e usaram câmeras de celular.O ‘flagrante’ aconteceu durante uma apresentação do grupo de pagode O Troco, que costuma convidar as espectadoras para subir ao palco e fazer a coreografia da música “Todo enfiado”. O vídeo já teve mais de 100 mil acessos no YouTube.
Como pouca gente leva a sério as lições da Web, outro caso vem à tona. Desta feita atinge um executivo de uma grande empresa de hospedagem de sites – o ex-diretor comercial da Locaweb, talvez a maior empresa de hospedagem de sites do Brasil e patrocinadora do São Paulo Futebol Clube.Corintiano doente, o executivo não segurou a emoção ao ver o Timão fazer gols no São Paulo, time que leva a marca da Locaweb na manga. Disparou várias frases no Twitter. Se o executivo fosse um torcedor comum, talvez ficasse apenas na costumeira postura de desagravos cometidos entre torcedores e seria rotulada como mais uma baixaria na web e, portanto, seria esquecida, mas acontece que o executivo não era apenas um simples torcedor fanático do Timão. No Twitter frases do tipo “Chupa, bambi, relaxa aí que ainda tem GOL do gorducho!!!!! So da Locaweb na manga do Rogério!!!!!!!!!!!!” foram publicadas. Depois que acabou o jogo e viu a repercussão do ato emocional, o executivo apagou as mensagens, mas a torcida do São Paulo, indignada, fez screenshots e enviou a Locaweb e ao São Paulo em protesto pela atitude do então diretor comercial. Mesmo com um pedido formal de desculpas (“Minhas sinceras desculpas à torcida e ao time do SPFC. No calor do clássico, o torcedor tomou conta do profissional. Não acontecerá de novo”), Alex não escapou da punição.
O castigo veio na velocidade da Web – Os torcedores do São Paulo mandaram mais de 2 mil tweets em protesto e chegaram a pedir a saída do patrocinador… Ou seja: fizeram a maior confusão e com toda a razão (antes que batam em mim em São Paulo sou santista e no Ceará torço pelo Ferroviário). Gritar gol, comemorar, tirar onda, vibrar – cai bem no estádio, mas nunca na janela do prédio, no Twitter ou em qualquer outro site de relacionamento.
“Futebol foi, é e sempre será um território movido pela paixão. E sujeito, muitas vezes, a manifestações impensadas. Hoje, infelizmente, um funcionário da Locaweb, no calor de sua paixão, se manifestou de maneira equivocada sobre o resultado do jogo entre São Paulo e Corinthians , dando a muitas pessoas a impressão de que a sua opinião pessoal era a opinião institucional da empresa. A Locaweb vem a público esclarecer que a opinião de seu funcionário não corresponde à da empresa e se desculpa por eventuais mal entendidos ou constrangimentos causados por esse funcionário.”
“Fechar uma parceria com o São Paulo e expor nossa marca na camisa de um dos times de maior prestígio do País para nós é motivo de orgulho. Assim como já fizemos com outras equipes, a Locaweb tem ciência da força do futebol e respeita muito todas as torcidas.”
“A Locaweb hoje é a maior empresa de serviços de internet da America Latina e conta com centenas de funcionários, entre eles são paulinos, corintianos, palmeirenses, santistas, flamenguistas, gremistas, colorados e muito outros torcedores de times nacionais e internacionais. Mas essa diversidade que está no âmbito pessoal de cada funcionário, e nunca, de modo algum, na posição institucional da empresa, foge às vezes de nosso controle, como no episódio de hoje (data das mensagens-grifo nosso). Esperamos que todos que se sentiram ofendidos pelo nosso funcionário, nos desculpem, e garantimos que medidas cabíveis serão tomadas em relação a isso.”
Que lição tirar de tudo isso?
Existe uma máxima que eu costumo levar a sério e a gente normalmente aprende pela dor. Você pode fazer o que você quiser, tem liberdade pra isso, mas de uma coisa você não se livra e nem pode escolher de que forma acontecerá-são as consequências. Elas podem ser breves ou podem durar uma vida inteira. Outra máxima que se junta a essa é a que diz que “não importa como você é por dentro, são as suas atitudes que o definem.” O executivo com certeza deve ser aquele cara boa-praça, de bons relacionamentos, apaixonado por futebol-como a maioria dos brasileiros-e um executivo de sucesso, senão não estaria no cargo que ocupava até o incidente, mas isso de nada adiantou e pouco pesou na decisão da empresa, que acredito ter sido penalizada duas vezes-a primeira por ter sua imagem marcada pelo fato e a segunda por ter que desligar um bom executivo que por razões emocionais e de imagem precisou ser substituído.
O mundo corporativo é bem diferente do mundo político. No primeiro a imagem é tudo, no segundo apostar na falta de memória é a lei. Nas duas existe uma figura comum-o consumidor-que tanto existe na relação comercial como na relação política-visto na forma de beneficiário-contribuinte.
Uma coisa é certa: esta não será a primeira vez e nem será a última onde a web serve de palco para uma gafe. As pessoas confiam que não vai vazar e quando menos esperam está na web e o estrago já foi feito. Enfim, tais pessoas confiam suas imagens a outras, confiam na sorte de que ninguém vai ver e pior-acreditam que por estarem se divertindo-ninguém estará filmando e não vai acabar na web. É comum as empresas pesquisarem nas redes sociais durante o processo de seleção. Muitos candidatos são retirados da lista antes de serem contratados e nem sabem por que-as empresas têm seus critérios de seleção e alguns desses são velados. Apesar de protestarem e muitos não acharem correto, quem contrata escolhe o que deseja ter na sua empresa. E mesmo com todo cuidado ainda acontecem fatos desagradáveis. No mundo conectado vale menos o que você é mais o que você faz.
No mundo corporativo dedicado a tecnologia é comum lermos notícias a respeito de funcionários da Microsoft que usam Apple. Ainda não deu demissão, mas todo cuidado é pouco. É estranho, mas as corporações não gostam de ter em seus quadros pessoas que possam gerar riscos à sua imagem e aos seus negócios. É muito estranho existir um padre que prefere outra religião ou seita em vez da que professa. Se não concorda ou se a paixão é maior que o emprego ou que a causa, que mude de emprego, de causa ou de crença. Será melhor para a imagem dos dois.
Certa vez lá na casa dos meus pais (isso faz muito tempo e por isso eu aprendi essa lição bem cedo), jogavam Flamengo e Vasco. Era o lançamento da Sukita. Minha mãe flamenguista doente, meu pai vascaíno roxo. O Vasco ganhou nos pênaltis e o papai resolveu comemorar abrindo uma Sukita. Quase deu separação e até hoje minha mãe não compra Sukita e este é um assunto proibido lá em casa.
Fica a dica: se você está trabalhando numa empresa que patrocina um time ou alguma equipe pela qual você não torce (e não deseja sair dela), o melhor a fazer é torcer em casa. Se quiser treinar o controle emocional-vá ao estádio com a camisa do time adversário, sente-se na torcida uniformizada do time que você não torce e na hora do gol do seu time em vez de gritar golgrite-“Droooooooooooooooooogaaaaaaaaaaaaaaaaaa!!! Vamos, lá… ainda dá tempo!” Pode ser extremamente desagradável treinar isso dessa forma, mas vai ajudar a preservar seu emprego, sua imagem e fazer com que este missivista escreva sobre outro assunto pela falta de fatos sobre este tema. A propósito-quando gritar “drooooggaaaaa!!!!” não sorria e nem pule ou abrace o torcedor do lado. O corpo fala e você pode acabar sendo denunciado pelo ato em vez da palavra.
Já que é Semana Santa – queria deixar aqui uma frase que simboliza a filosofia dos guerreiros que acreditam nas suas causas-“Um mártir nunca é derrotado se morrer lutando, mas perderá uma grande chance se desistir de lutar.” Feliz Páscoa!
Para me acompanhar no Facebook – Luis Sucupira Para me seguir no Twitter –