Eduardo Saçaki: O "Japonês Voador"

Eduardo Saçaki: O  "Japonês Voador"

Por Mário Sérgio Figueredo

Motonline

Caro leitor, o que você vai ler neste texto é uma história de talento, de dor, de coragem e de superação. É a história de alguém que por amor ao esporte passou por ótimos momentos, mas também por provações capazes de fazer qualquer ser humano “jogar a toalha” e até desistir da vida. Mas ele não desistiu, levantou-se, recuperou as forças e continuou em sua batalha por aquilo que mais gosta, andar de moto.

O herói virou lenda, uma “lenda viva” em seu esporte. Você lerá sobre alguém que proporcionou tantas alegrias e muito orgulho aos aficcionados do Motocross nacional.

Conheça agora um pouco da história de um grande brasileiro, que merece respeito e a reverência:

Eduardo Yoshio Saçaki, também conhecido como “Japonês Voador“, nasceu na cidade de Curitiba (PR) no 11 de maio de 1969, radicando-se em Cascavel (PR). Aos 13 anos já andava de moto pela cidade, quando entrou para a motovelocidade no autódromo local. Chegou a ser campeão paranaense e ficou em quinto no brasileiro, demonstrando desde cedo que tinha grande talento, prenunciando um grande campeão.

A real vocação, o motocross, foi descoberta por acaso, quando seu pai lhe comprou uma Honda XL 250 e o levou para competir nas prova dos campeões em Londrina. A moto quebrou mas a experiência foi suficiente para redirecionar sua carreira.

Saçaki ainda garoto, chorando, por ter o eixo trazeiro quebrado enquanto liderava uma prova em Curitiba

Saçaki ainda garoto, chorando, por ter o eixo trazeiro quebrado enquanto liderava uma prova em Curitiba

Durante algum tempo a diversão de Saçaki era saltar com uma 125cc street nos terrenos baldios da cidade, atraindo os moradores para ver aquele jovem destemido, moto que muitas vezes seu pai teve que trancar a cadeado porque ele não ia bem nos estudos, só queria saber de moto.

Saçaki muito jovem, logo no início da carreira

Saçaki muito jovem, logo no início da carreira

No ano de 1984 começou sua carreira no Motocross Nacional. Em 1985 foi  piloto oficial da Agrale e em 1986, com apenas 16 anos, já era piloto Oficial Yamaha do Brasil, pela equipe Shell/Marlboro à qual representou por 17 anos de sua carreira. Na mesma época foi contratado também Jorge Negretti, seu companheiro e rival nas pistas.

O APELIDO – Segundo declarações da família, Saçaki ganhou o apelido de “Japonês Voador” numa competição em que se chocou contra um mastro de bandeira ao lado da pista, dando um giro de 360º com a moto em pleno ar e voltando à pista sem cair, continuando a prova até seu final. Não se sabe se foi só a sorte ou se o talento do piloto também contribuiu para que a “manobra” involuntária felizmente desse certo. Quando subiu ao pódio o locutor Zezito gritou: é o “Japonês Voador”, e o apelido pegou, acompanhando-o até os dias de hoje.

Apesar da pouca idade foi Bicampeão Brasileiro de Motocross nos anos de 1988 e 1989 na principal categoria do campeonato. No começo dos anos 90, quando já era penta-campeão de supercross e campeão no motocross. Foi buscar experiência fora do país, para ser mais exato, no Japão, onde foi vice-campeão Japonês de Motocross e campeão de Freestyle em 1992.

Após seu retorno do Japão foi piloto destaque no Brasil e no estado de Santa Catarina. Competiu também nos EUA, Europa e em toda a América Latina.

No ano de 1999 resolveu se dedicar somente ao Arena Cross onde foi seis vezes Campeão Brasileiro na competição. Em 2003 resolveu voltar a competir no Brasileiro de Motocross, onde obteve ótimos resultados.

Esbanjava carisma e simpatia

Esbanjava carisma e simpatia

O ACIDENTE – No ano de 2005 que veio o pior, o piloto caiu em um treino na cidade de Carlos Barbosa (RS), sendo levado para o um hospital da cidade, mas devido ao seu quadro extremamente grave, foi logo transferido para outro hospital na cidade de Caxias do Sul (RS), que oferecia mais recursos para tentar salvar o piloto. O quadro era terrível, uma grande hemorragia interna exigiu que fosse operado e teve retirados o baço e um rim, complementado por traumatismo craniano. Com a forte pressão sobre o cérebro, entrou em coma, situação em que por duas vezes os médicos cogitaram uma suposta morte cerebral, pois não reagia aos testes. Saçaki chegou até a receber o sacramento de Extrema Unção, nem os médicos acreditavam na sua recuperação.

Mas um milagre aconteceu e, felizmente, após 10 dias o “Japonês Voador” acordou, e depois de 20 dias estava em casa, se recuperando do grave acidente. Ainda passou por mais duas cirurgias em função da queda e convive até hoje com déficit de memória imediata, principal motivo dele ter abandonado a idéia de se dedicar ao enduro (em 2011). Esse déficit o impede de memorizar a primeira volta de reconhecimento e na hora de acelerar pra valer na volta seguinte, tem dificuldades em lembrar o percurso, o que torna a prova muito perigosa.

O público comparecia às corridas para ver os saltos do "Japonês Voador"

O público comparecia às corridas para ver os saltos do “Japonês Voador”

O leitor há de se perguntar o por quê da publicação de uma foto tão chocante, mostrando uma pessoa em uma UTI. Para responder a essa pergunta, estão reproduzidas as mesmas palavras do próprio Saçaki em uma rede social:

Saçaki na UTI, logo após o acidente, em 2005

Saçaki na UTI, logo após o acidente, em 2005

” Quando minha irmã tirou esta foto, algumas pessoas perguntaram: para quê? (Inclusive médicos e enfermeiras), lembre-se dele de outra maneira (estava eu morto?), porque se eu sobrevivesse, as probabilidades de ter perdido minhas funções motoras e neurológicas eram quase uma certeza e ela respondeu: eu vou mostrar pra ele quando saírmos daqui e ele vai caminhar e iremos pra minha casa, e assim aconteceu. Fé é simples, ou tem, ou não tem! E coragem também.Resolvi postar esta foto pra mostrar a importância da fé e superação! – Eduardo Saçaki ”

 

Em 1988, Saçaki já tinha uma coleção de troféus

Em 1988, Saçaki já tinha uma coleção de troféus

No início de 2006 voltou a ter contato com a moto, mas resolveu que iria encerrar sua carreira, atendendo pedido da sua família. Em 2008 passou a se envolver apenas com a produção de eventos de motocross e treinamento de pilotos novatos.

No ano de 2009 voltou a treinar e fez algumas provas despretensiosas no sul do país e no ano de 2010 foi comentarista do Arena Cross.

Somente no ano de 2011 é que voltou a sentir grande vontade de voltar a pilotar. Inicialmente pensou em mudar para o enduro mas logo desistiu porque teria que começar o aprendizado do início, já que não tinha conhecimento nenhum dessa modalidade e também pelo déficit de memória imediata que citamos acima. Concluiu que o negócio dele era realmente o motocross, que não dependia de memória, apenas de raça, coisa que ele tem de sobra.

Treinou somente por algumas semanas e já estava participando da penúltima etapa do Brasileiro de Motocross, e fez bonito, indo para o pódio na terceira colocação; o campeão estava de volta.

Dominava a máquina como ninguém

Dominava a máquina como ninguém

Na vida do campeão  existem muitas histórias, apenas registradas na memória de seu amigos, como é o caso dessa contada pelo seu amigo Mário Maeda. Segundo Maeda,  quando Saçaki perdeu seu patrocínio, foi disputar a etapa do Latino Americano de Motocross em Canelinha (SC). Sem recursos, correu com uma moto de trilha emprestada por outro amigo, o Palhoça.

A duas voltas do final , na ponta, de tanto tentar acelerar mais do que a moto podia, quebrou o cabo de acelerador e, não teve dúvidas, enrolou o cabo de aço na mão e ainda assim terminou a corrida, todo estourado, mas com a alma lavada, lavada com as lágrimas de todos que assistiram aquela chegada cinematográfica. Isso foi pouco antes de partir para o Japão, outra etapa espetacular da sua jornada no motocross, que contamos a seguir:

Quando o Sacaki chegou no Japão, era mais um dekasségui com menos de 100 dólares no bolso e muita vontade de vencer. Com uma moto emprestada por um trabalhador brasileiro, sem mecânico, mostrou que o que movia aquele pilotinho brasileiro louco era muito mais que vontade, era raça pura e levou exatamente quatro etapas para ele aprender um pouco de mecânica, regular a moto e vencer a sua primeira corrida do Campeonato Japonês de Motocross, à frente de pelo menos vinte pilotos de fábrica, em Suzuka (JP), casa da Honda, chegando na frente até mesmo das lendárias motos do Team Honda Racing (H.R.C.).  Com esses resultados, até o Presidente da Honda e sua esposa (substituto do Sr Soichiro Honda, já falecido), foram lá conhecer e cumprimentar pessoalmente aquele dekasségui que com uma moto velha, sem mecânico, com a suspensão toda desregulada, conseguiu vencer os seus melhores pupilos.

Seu carisma conquistou o público no Arenacross em Curitiba (PR)

Seu carisma conquistou o público no Arenacross em Curitiba (PR)

Seu feito no Japão foi tão espetacular que despertou o interesse da Equipe H.R.C. (Honda Racing, time oficial de competição da Honda), que o contratou como piloto de testes. Mas o destino novamente pregou-lhe uma peça e na penúltima etapa do campeonato, vice líder até então, sofreu uma grave lesão na segunda vértebra cervical, inviabilizando assim os seus objetivos no Japão.

Retorno ao ArenaCross em 2012

Retorno ao ArenaCross em 2012

Você pensa que ele desistiu? Que nada, aquilo só serviu para dar mais força e com uma moto de 125cc foi campeão do Supercross de Praia, andando com uma prótese cervical, enfrentando a dor, toda aquela areia e todas aquelas 250cc.

Para 2012, nove longos anos após o terrível acidente, os planos são os melhores possíveis; depois do retorno na primeira etapa do Arena Cross em Curitiba, o piloto pretende cumprir todas as etapas do campeonato Brasileiro de Motocross, voltando a fazer o que mais gosta.

Saçaki, hoje com 43 anos, sabe que o peso da idade vai complicar a sua volta – seus adversários tem praticamente a metade dessa idade – mas isso não o desanima, e também não a seus fãs, que contentam-se em apenas vê-lo na pista, executando saltos que só ele, o “Japonês Voador”, sabe dar.

No dia 05/09/2012 Saçaki postou em sua página de uma rede social declaração que reproduzimos parte, deixando claro que está, definitivamente, deixando de correr, decisão apoiada por sua família. Essa decisão teve forte influência de um pinhão quebrado enquanto treinava:

“Na quinta passado, quando quebrou o pinhão da moto em três partes na entrada da mesa, não tive a dúvida que o Sr Deus mais uma vez, estava me dando o livramento, pois poderia ter sido fatal, mas a queda não aconteceu.”, escreveu Saçaki.

” Agora vou cuidar mais da minha vida, com o lado Razão, difícil tarefa, pois sou pura Emoção. Vou cuidar da minha Esposa Juliana e da minha Filha Eduarda. Quero acompanhar o histórico do meu Filho Paulinho com sua vida tocada a Emoção junto ao Dirt Jump com bike. Quero dar o devido Carinho a Parentes e Amigos. O meu Forte abraço aos admiradores do Japonês Voador”, concluiu Saçaki.

Em se tratando de Saçaki, não podemos garantir que seja definitivo; aplacar o forte desejo de competir, dentro do peito desse “artista” do motocross, não vai ser tarefa fácil.

Qualquer que tenha sido sua decisão, é a acertada, pois Saçaki não precisa fazer mais nada pelo motocross, não precisa provar mais nada para ninguém. Seu nome já está escrito nas estrelas e de lá nunca será apagado.

PRINCIPAIS TÍTULOS:
– Bicampeão Brasileiro de MX
– 5X Campeão Brasileiro de SX
– Bicampeão Latino Americano de SX
– 6X Campeão Brasileiro de AX
– Campeão Japonês de MX e FMX
– Bicampeão Catarinense de SX
– Campeão Paranaense de MX e SX
– Campeão Mato-Grossense de MX e SX
– Campeão Carioca de MX e SX
– Campeão Paulista de SX
– Campeão Rio Minas de SX e MX
– Campeão Ultra-Cross
* SX = Supercross / MX = Motocross / AX = Arena Cross / FMX: Freestyle

Saçaki desde cedo estava acostumado com o lugar mais alto do pódio

Saçaki desde cedo estava acostumado com o lugar mais alto do pódio

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Fonte: O próprio piloto – Família: Paulinho Saçaki, Claudia Saçaki – Amigos: Mário Maeda – Fotos: arquivo pessoal do piloto, arquivo de família e arquivo Motonline

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