Iron Butt Saddlesore 2000 Rules – todos os estados do Nordeste em 46 horas
Por Ismael Andrade, especial para o Você e Sua Moto
Confira o relato e o desafio do piloto e instrutor Ismael Andrade na realização de uma das mais difíceis provas de resistência – o Iron Butt que numa tradução livre seria algo como ‘bunda de aço’.
O mapa escolhido passou por todos os estados do Nordeste, sendo que deveria percorrer um mínimo de 100 km em cada e não se deveria passar novamente pelo mesmo ponto, retornando enfim a origem, como se fosse um grande círculo, percorrido no sentido horário, tendo Fortaleza como o ponto de partida.
A Escolha da Rota
Em relação à escolha da rota, os mapas devem ser bem detalhados, com trechos que permitam uma rodagem mais livre. É uma característica do Nordeste que as principais vias cortem os municípios pequenos, com muitos limitadores de velocidade e lombadas físicas. Da rota escolhida, só repensaria a passagem por Garanhuns(PE), pois é fácil perder-se. Atravessei a região metropolitana e o início da rodagem em Sergipe; passei por rodovias estaduais muito pouco movimentadas, sem acostamento, sinalização ou área de telefone, no resto o trecho estava bem equilibrado.
A Sequência da Rota
A sequência seguida para o primeiro dia foi Rio grande do Norte, via Mossoró, entrando na Paraíba via BR 101, sendo desviado para Campina Grande indo daí para Pernambuco, com pontos de passagem por Caruaru e Garanhuns.
A rota por Alagoas foi seguindo em direção a BR 101, entrando por Palmeira dos Índios. Já em Sergipe, após a passagem pelo Rio São Francisco, ponto mais ao Sul da viagem, derivamos a direita para Bahia, passando por Paulo Afonso e seguimos para Salgueiro, descansando do primeiro dia após Picos/PI, parando próximo das 21 horas. Neste dia, o odômetro da moto chegou a 2035 km em 23 horas de percurso. A primeira meta que seria o Iron Butt SS 2000K foi atingida.
No hotel, o corpo estava até inteiro, mas com sono, ainda tive que reorganizar tudo para o segundo dia, a euforia de realização da meta intermediária, tinha que dar lugar a tranquilidade necessária para uma boa noite de sono, pois o despertador iria badalar as 04h30min.
O Segundo Dia da Rota
O segundo dia tinha uma planilha mais tranquila a cumprir, só faltavam 1200 quilômetros para acabar a viagem e teria até as 22horas para chegar. Às quatro e meia o despertador tocou e às cinco e meia já estava na estrada. A pior ‘pernada’ que fiz foi a primeira planejada para este dia. Estava pensando o quanto seria chato este dia, mas a culpa era da preguiça mesmo (risos). Depois de 150 quilômetros parei, abasteci, tomei um novo café, conversei com uns dois curiosos e o relógio biológico do motociclista, finalmente, ligou.
O trecho deste dia seguiu em direção a Teresina (PI), indo para a divisa do Piauí com o Maranhão pela cidade de Miguel Alves. A passagem demorou cerca de uma hora, pois envolveu uns 15 quilômetros de terra e uma balsa no Rio Parnaíba.
Os Últimos Quilômetros
Chegamos ao último e nono estado a percorrer. Segui até Parnaíba (PI), entrando no querido Ceará por Chaval (CE). Para cumprir a planilha e chegar às 2000 milhas, a viagem seguiu até Sobral (CE) e depois Canindé (CE), de onde, após o último abastecimento, tive que manter a atenção e cabeça no lugar, pois já era noite e, confesso, a euforia de chegar já estava batendo. Às 20h15min estacionei no mesmo posto que iniciei a viagem, tomei o mesmo café e fiquei ali tranquilo, olhando a moto, sentindo a mão do acelerador um pouco dormente.
Os Problemas de Percurso
Tive poucos problemas. A base do GPS não conseguiu carregar, então só tive a chance de usá-lo por umas 4 horas e a lâmpada do farol baixo, que queimou as 3h da manhã do primeiro dia, enquanto passava por Natal (RN). A iluminação fez falta. Obrigou-me a reduzir a velocidade, pois só contava com farol alto – menos mal já que esta falta foi suprida, em parte, pelos faróis de led auxiliares. A troca foi efetuada na cidade de Palmeira dos Índios (AL) próximo ao meio-dia. Dica, a lâmpada custa R$ 30,00 reais e é muito pequena, na próxima viagem, já vou sair com uma.
As imagens que não saem da cabeça
Apesar da planilha apertada em relação ao tempo, o que vi não sai da cabeça, mesmo assim consegui parar e tirar fotos em cada passagem de Estado. Assim fiz quando estava acima da linha as nuvens entre Paraíba e Pernambuco; dos Cânions do São Francisco em Paulo Afonso (BA) e da parte de terra e balsa entre Piauí e o Maranhão, que tem uma beleza impressionante.
Viajar só, com certeza não é o mais recomendado, o interessante seria fazer em três motos, pois em caso de pane, um fica com quem teve o problema e o terceiro, vai em busca de auxílio. Mesmo só, em cada parada, repassava minha localização a um grupo que estava acompanhando o trajeto e fiz contato com os amigos que tenho espalhados e, em cada Estado do Nordeste, tinha sempre o contato de alguém que poderia me auxiliar em caso de algum imprevisto.
O restante é aproveitar. Só quem viaja de moto sabe o prazer que isto representa. Cada pessoa conhecida na viagem, cada imagem guardada, cada pensamento esmiuçado dentro de meu capacete nestas 39 horas pilotando, sem mais ninguém para conversar, faz você voltar um pouco melhor para casa; mais leve, mais feliz.
Ismael Andrade é Policial Rodoviário Federal e instrutor de pilotagem com vários cursos ministrados para proprietários da marca Harley-Davidson, BMW e motoclubes.