O jogo era para ter acontecido. O voo não era para ter decolado. Uma reflexão sobre a ganância
Vamos direto ao ponto.
O voo não deveria ter sido autorizado, pois não tinha combustível como manda a norma.
O piloto não pediu prioridade por estar sem combustível enquanto o outro estava com suspeita de vazamento, tudo indica, por medo da multa e de ter o erro descoberto e punido.
Enfim, falha humana que teve como resultado uma tragédia mundial. Muita coisa vai mudar após esse desastre anunciado ainda quando estava em solo na Bolívia.
Mas, um detalhe, precisa ser analisado. A ganância pela obtenção máxima de lucro, independente do risco que correria.
A reflexão tem por base alguns fatores da personalidade humana onde desejar ganhar o máximo sacrificando a qualidade do serviço é uma tônica de empreendedores atuais. Os fins sempre justificando os meios e o feito nas coxas e à meia-boca.
Reduzir custos a qualquer custo, até mesmo correndo risco de morte.
Foi a ganância aliada ao medo de tomar a atitude correta que derrubaram o avião da LAMIA. Apenas isso.
Vamos aos fatores que comprovam isso.
O primeiro deles está na economia das despesas provenientes com uma escala onde teriam mais custos com combustível, taxas de pouso e decolagem etc. Para não diminuir a margem de lucro resolveu apostar que desta vez a Lei de Murph não iria funcionar.
O dono-piloto ou piloto-dono ainda tinha uma chance de salvar a todos e ser punido vivo por isso. Porém decidiu insistir no erro de tentar a sorte e não informar que estava sem combustível, a não ser quando a queda era iminente.
Nada disso era para acontecer pois era o dono que estava comandando e ele tinha autonomia, por que era o piloto também, de decidir corretamente, pois estava em jogo, além da sua vida, o futuro da sua empresa. Mas não pensou assim. Prevaleceu apenas a ganância pelo lucro a todo custo, custe isso o que custar.
Um empresário que maquia, burla, corrompe, desrespeita normas, coloca a vidas das pessoas em risco deveria ter seu CNPJ cassado. Nada justifica a irresponsabilidade do lucro a qualquer custo, nada!
Estamos vendo diariamente no Brasil e no mundo produtos adulterados, remédios fraudados, serviços que não se entrega, acertos que não são cumpridos e empresários aliados a políticos para roubar remédios da população e comida das crianças.
Não, leitor. Chegou a hora de levar as coisas à sério e respeitar as regras. Talvez, quem sabe, o funcionário dessa empresa não tivesse feito essa burrada pois saberia que estaria provocando uma tragédia, mas o piloto-dono da empresa preferiu correr o risco de morte do lucro a qualquer custo.
O acidente com o VARIG 254 que errou o curso e caiu sem combustível e o voo que se perdeu nos Andes chilenos e que levava um time de hockey uruguaio também terminou da mesma forma e transformou-se em um dos mais incríveis relatos de sobrevivência. Todos foram resultado de falha humana, mas não de ganância.
A ganância derrubou o avião, sim. Mas a falta de atitude também. Esse voo poderia ter sido proibido de decolar, mas não foi. O voo da LAMIA deveria ter feito escala técnica, mas não fez. O piloto era para ter pedido prioridade e pagado o preço do seu erro por ter provocado a pane seca, mas não quis.
Sou defensor da segurança e crítico ferrenho da irresponsabilidade muito comum entre os motociclistas. De tanto acontecer já nos acostumamos a receber notícias via redes sociais de companheiros mortos e de motociclistas que nem mesmo sabemos quem são. Ainda assim, por ter se tornado praticamente banal, tomo como inaceitável qualquer perda de qualquer vida por imprudência e redução de custos, pois muitos motociclistas estão rodando com pneus lisos, quase sem freios, com correntes frouxas assumindo para si o risco de morte.
A Chapecoense será declarada campeã da Copa Sul-americana, sem gols, sem festa, sem volta olímpica e sem poder levantar a taça. Os colombianos, que também perderam com isso, tiveram a atitude que o piloto-dono não teve. Não foram gananciosos. Foram solidários e desprendidos de qualquer soberba, orgulho ou ganância. Enxergaram o futuro por terem também se visto no lugar de quem se foi.
A Colômbia não só deu uma lição ao esporte mundial, mas ensinou sobre humanidade.
O jogo que não aconteceu, a final que não haverá, ainda assim lotou um estádio inteiro, que com o coração na ponta da chuteira jogou sem bola e cheio de grande emoção onde a saudade rolou no gramado verde que eternizou a Chapecoense como o time de maior torcida no mundo.
O jogo era para ter acontecido… O voo não era para ter decolado.
Força, Chape!