Você divulga imagens de mortos em acidentes? Leia isso, por favor.
A internet trouxe o acesso irrestrito a informação. Isso é um fato inquestionável. Porém, na mesma proporção da liberdade de acesso, veio com ela, a libertinagem da informação. Tudo se posta na internet, sem o menor pudor, avaliação ou sob qualquer critério ético ou de valor.
Quero falar dos grupos que trocam imagens e vídeos de pessoas mortas em acidentes e crimes. Tais grupos alimentam uma curiosidade mórbida de ver pessoas estraçalhadas, mutiladas ou em vídeos que mostram seres humanos agonizando nos seus últimos momentos de vida. Esse tipo de doença – pois se trata de uma patologia – não respeita nada, nem mesmo, crianças. É comum receber vídeos de crianças agonizando em acidentes ou vítimas de bala perdida. Decapitações e execuções sejam elas feitas pelo Estado Islâmico ou não, são muito mais comuns do pensamos.
A desculpa de muitos é que tais imagens de acidentes possuem cunho “educativo”, pois “ao serem divulgadas, tem o poder de mudar a postura em virtude do choque que causam” (sic). Se assim fosse, não teríamos tido mais massacres de populações depois das imagens fartamente publicadas sobre o Holocausto Judeu. A maioria das pessoas fica absurdamente indignada numa proporção desmedida quando aparecem vídeos de animais imolados, judiados etc; mas mostram pouca indignação quando os protagonistas dos sofrimentos são seres humanos. A vida humana foi banalizada. E ainda tem gente que chama os índios de selvagens…
De todas essas atitudes, algumas das piores, acontecem no meio motociclístico e são produzidas e viralizadas por MOTOCICLISTAS ou aqueles que ANDAM DE MOTOCICLETA. Sim, amigos! MOTOCICLISTAS! Tais pessoas que repassam isso não percebem que a imagem espalhada se trata de alguém com família – pai, mãe, esposa, filhos, irmãos e amigos. Porém, do outro lado, existem aqueles que ‘curtem’ ver isso. Ou seja – a patologia e a atração pelo mórbido ocorrem em mão-dupla. Tem quem publique por que tem quem assista.
A ética dos veículos de comunicação através dos seus manuais de conduta bloqueia ou maquia publicações de imagens fortes que exponham pessoas de forma a denegrir ou degradar a sua condição humana. Nesse sentido, já existe, desde de 2013, um projeto de lei que visa proibir “a divulgação de imagens de mortos em acidentes e por crimes”. Trata-se do PL-5013/13.
Com a chegada das redes sociais, aplicativos de troca de mensagens, tipo WhatsApp, este tipo de imagem vem se proliferando a ponto de existirem grupos que só publicam isso. Existem grupos para todos os gostos e desgostos, mas vamos tratar de um tipo que muito incomoda quem está do outro lado da imagem – a família.
Recentemente perdi mais um amigo em um grave acidente motociclístico. Apesar dos apelos para que não postassem imagens do corpo sob qualquer pretexto, ainda assim, apareceu um infeliz que conseguiu tais imagens e as enviou nos grupos de WhatsApp. Tais imagens rapidamente viralizaram a ponto de não respeitarem nem mesmo os pedidos dos administradores de alguns grupos.
Para essas pessoas que adoram espalhar tais imagens e vídeos, bem como para as outras que gostam de assistir quero deixar aqui o que eu vi e senti, mais uma vez, ao enterrar um amigo vítima de acidente com moto. Além da dor de perder um amigo você ainda divide o sofrimento com a família. Como se isso só já não bastasse, continua a sofrer sabendo que a imagem ou o vídeo do seu amigo morto, com o corpo inerte, sem vida, está se espalhando com a rapidez de uma praga pelos grupos e por redes sociais.
Eu ouvi o choro e o lamento daquela mãe que perdeu seu filho mais querido. O gemido, os soluços, os incontáveis lenços que tentaram enxugar as lágrimas que nunca secarão. Serão rios de lágrimas e mesmo que sequem seus olhos de tanto chorar, ainda assim, aquele turbilhão de lágrimas não vai aplacar aquela dor que nunca acaba. Eu ouvi o choro daquela mãe cujo a imagem do filho morto estava circulando na internet saciando a sede de curiosidade pelo mórbido. Eu senti mais uma vez aquela dor. Eu doí junto com aquele lamento. Meus ossos arderam de angústia e eu chorei junto. Diz um filósofo que a dor de uma mãe que perde um filho produz um choro e um lamento tão fortes que até o pior dos imundos, na sua infinita maldade, respeita.
Assim, por tudo que foi acima exposto, peço a você caro leitor, que não repasse imagens de crimes e de acidentes. Se você não respeita o morto, pelo menos respeite a família. Nenhuma mãe ou pai desejaria que seu filho acabasse morto por conta de um acidente ou crime.
Certo dia fui chamado para pedir ao Google a retirada de um vídeo que mostrava uma vítima de atropelamento. Esta senhora era mãe de alguém que antes assistia e replicava imagens de pessoas mortas em acidentes e através de crimes. Não deu para, infelizmente, evitar a sua viralização. Mas deu tempo de ouvir dessa pessoa que naquele momento ele sentia “a pior das dores” – a de não poder preservar a dignidade da própria mãe, estraçalhada por conta do acidente. A cada vez que o vídeo circulava ou mesmo quando chegava no seu e-mail, “era como se ele sentisse novamente a dor da morte do ente materno”.
Amigos, devemos manter o respeito pelas pessoas. Devemos lembrar que poderemos ser nós a estarmos do outro lado da tela – aquele lado onde nós deixamos de ser os expectadores para sermos os protagonistas da cena, onde no mesmo tempo que matamos a curiosidade de alguém, também fazemos outrem sucumbir pela dor toda vez que a imagem daquela perda do ente querido circula pela web.
Não é necessária uma lei para proibir isso. Basta respeito.